sábado, 31 de março de 2012

A juventude na luta revolucionária

A juventude na luta revolucionária

Artigo publicado no Dossiê Juventude da Revista Correio Internacional (Nova Época) nº 5, junho de 2011.


Glória Trogo e Jorge Badaui, da Secretaria Nacional de Juventude do PSTU


• “Ontem éramos todos tunisianos, hoje somos todos egípcios. Amanhã seremos todos livres.” A frase, entoada por uma multidão de jovens nos dias que antecederam a queda do ditador Mubarak, expressa bem o fenômeno político que ganhou a atenção do mundo no início deste ano. A juventude árabe tomou o seu lugar na história e, contrariando a propaganda neoliberal, provou que nada é impossível de mudar.

A atualidade não parece mais confirmar a ideologia de que “as revoluções são impossíveis” ou “coisas do século passado”, e que as “massas são incapazes de definir seus destinos”. E, assim, a presença incontestável de milhões de jovens em ação é, hoje, característica definidora das principais lutas sociais do início do século XXI, em nível mundial.

Para desalento do imperialismo e dos governos de todo o mundo, a geração posterior ao mito do “fim da História”1 está, ela própria, transformando-se. E quando os olhos do mundo se voltam ao mundo árabe e aos conflitos na Europa, veem essa juventude desfilar novamente pelas ruas, com combatividade e esperança.

Quando esses garotos e garotas, jovens trabalhadores e estudantes, despertaram para retomar o futuro em suas mãos, puderam protagonizar enormes acontecimentos, daqueles que, ao final, mudaram o mundo.


Desde a eclosão da crise econômica mundial, em 2008, o imperialismo e os governos de todo o mundo tentam se salvar impondo ao conjunto da classe trabalhadora o desemprego, a precarização do trabalho e a perda de direitos sociais.


No mundo inteiro, a juventude sofreu esse processo de forma mais acentuada. Os próprios organismos da burguesia admitem isso: o relatório da OIT (Tendências Globais de Emprego para a Juventude, 2010) conclui que a taxa de desemprego juvenil atingiu o maior nível já registrado. Dos 620 milhões de jovens entre 15 e 24 anos economicamente ativos, 81 milhões (13%) estavam desempregados ao final de 2009. Entre 2007 e 2009, o desemprego entre os jovens subiu muito mais que na década que precedeu a crise econômica. Foram 7,8 milhões de jovens desempregados a mais nesse período. Entre 1997 e 2007, o número de jovens desempregados aumentou numa escala bem menor, em média 191 mil por ano. O estudo aponta ainda que, entre os jovens que têm emprego, 28% estão em situação de extrema pobreza, sobrevivendo com US$ 1,25 por dia.

As altas taxas de desemprego têm efeitos de longo prazo, uma parte significativa da juventude começa a desistir de procurar emprego. A participação dos jovens na força de trabalho já foi fortemente afetada. Em 56 países do mundo, existem 1,7 milhões de jovens que nem sequer fazem parte dos índices de desemprego porque abandonaram a procura por seu primeiro emprego.


No norte da África, a juventude tem uma enorme força social. No Egito, dos 80 milhões de habitantes, 2/3 tem menos de 30 anos. No entanto, a economia está longe de absorver esse ascendente crescimento demográfico: o índice de desemprego chega a 50%. A participação dos jovens no mercado de trabalho é a menor do mundo. Entre os que têm emprego, as condições são muito ruins: baixos salários, poucos direitos sociais e nenhuma organização sindical. O seguro-desemprego, as aposentadorias e os direitos sociais são garantidos somente aos funcionários públicos. A maioria dos novos empregos criados no Egito é no mercado informal. Por isso, muitos jovens com diploma universitário desempenham funções que não tem nada a ver com sua formação profissional.

A crise econômica deu aos jovens europeus muitos motivos para se identificar com os jovens egípcios. Na Espanha, a taxa de desemprego entre os jovens alcançou 40% e o número absoluto de desempregados é o maior desde 1976. Os países desenvolvidos foram os mais atingidos pela crise. Estar “à rasca” (sem perspectivas) era, até há alguns anos, um fato típico da periferia do sistema capitalista, mas não dos países imperialistas. A crise aproximou as realidades. Os países desenvolvidos são responsáveis por apenas 10% da força de trabalho jovem no mundo, mas concentram 72 % do aumento total do desemprego. Entre 2007 e 2010, o número de jovens desempregados nesses países aumentou 37%.


Uma geração perdida?
Baseado em um prognóstico de que o impacto da crise econômica será duradouro, o relatório da OIT alerta para o legado de “uma geração perdida”, sem perspectivas de futuro e nenhuma esperança de ter uma vida melhor, ou ao menos igual, à de seus pais. Esse é o projeto que o capitalismo quer impor para a juventude. Essa geração é a maior vítima da guerra social que está em curso na Europa.

Mas os milhões de jovens que vemos lutando nas ruas, contagiados pela força da “primavera árabe”, sabem o que querem. Com a irreverência e a vitalidade que lhe é característica, a juventude trabalhadora e estudantil entra em cena para decidir seu futuro. Nas praças espanholas, exibem seus cartazes ironizando com a frase típica do chefe do imperialismo: “Yes, we change”.


A queda das ditaduras, o questionamento aos planos de austeridade e a redescoberta de seu poder transformador por parte das massas em movimento enfrentaram, de conteúdo, o imperialismo. E os jovens de todo o mundo, que criaram expectativas em torno da eleição de Obama, veem agora o Nobel da Paz retomar a típica agenda de guerra do imperialismo.

Ao mesmo tempo, a enorme simpatia que gerou nos povos explorados e oprimidos do mundo assistir aquelas multidões transformarem praças e ruas em palcos de revoluções pode ser o fôlego definitivo para novas e poderosas lutas na arena mundial.

No dia 6 de abril de 2008, provavelmente aqueles rapazes e moças egípcios que começaram a se reunir para organizar um movimento nem sequer sabiam o que o futuro lhes reservava. O 25 de Janeiro levou milhões de jovens muito além: o início de uma reorganização juvenil já era o prenúncio do protagonismo da juventude nas mobilizações que estavam por vir. Além de golpeada pela crise econômica e social, essa geração já não podia ver sentido no despotismo de seus governos.


Os povos árabes estão enfrentando poderosas ditaduras e os europeus estão combatendo a “ditadura do mercado”. Aqueles exigem liberdades democráticas, estes pedem uma “verdadeira democracia”. Nos dois casos, o que está por trás é o sistema capitalista, em que o mais democrático dos regimes é uma feroz ditadura do capital.

Em tempos de crise econômica mundial, as conversas sobre “solidez” e “enormes possibilidades” no sistema capitalista já não encontram tanto eco nos que estão crescendo sem tomar parte em nada disso. Portanto, não é tolerável conviver com ausência de liberdade e escassez de oportunidades para aqueles que, pela sua própria natureza, têm um mundo a ganhar. Mas o mais interessante é que, quando se colocam em luta, os jovens emprestam à revolução características que impõem radicalidade e ousadia novas às mobilizações.


A luta de “cara nova”
A nova geração de jovens lutadores foi, assim, dando sua cara aos acontecimentos em que era uma peça-chave. Tomemos como exemplo a experiência de quatro amigos que criaram um convite a um “evento” no Facebook, em Portugal. O chamado se destinava aos “desempregados, ‘quinhentoseuristas’2 e outros mal remunerados, escravos disfarçados, subcontratados, contratados temporários, falsos ‘trabalhadores independentes’, trabalhadores intermitentes, estagiários, bolsistas, trabalhadores-estudantes, estudantes, mães, pais e filhos de Portugal”. De um fenômeno na internet, a manifestação da “Geração à Rasca” se transformou na maior mobilização no país desde a Revolução Portuguesa, na década de 1970.

Na Espanha, as mobilizações que tomaram as praças de mais de 60 cidades utilizaram o Facebook. Igualmente, no mundo árabe, as redes sociais e ferramentas de internet, amplamente utilizadas pelos jovens, tornaram-se instrumentos de articulação das lutas. E o desdém dos “especialistas” que falam do “fim do movimento organizado” ou da “revolução virtual” caiu por terra, já que a juventude se apropria de novos meios para retomar os métodos tradicionais do movimento de massas, a força da mobilização de rua, o vigor das palavras de ordem e o orgulho de ostentar suas faixas e bandeiras.


Por fora dos grandes aparatos e com um programa socialista, os jovens têm o mundo a ganhar
A juventude, que incorpora os meios mais modernos, também luta sem o peso dos velhos aparatos e das direções traidoras. Os jovens não têm nada a ver com as derrotas encabeçadas pelas direções das gerações anteriores. As revoluções no Leste Europeu tiraram dos stalinistas a autoridade de falar em nome da Revolução de Outubro. O espaço para as reivindicações democráticas e o forte sentimento antiburocrático presentes tanto na Espanha quanto no Egito são importantes expressões de que nem o stalinismo nem o fundamentalismo islâmico capitalizam globalmente os anseios da juventude. E isso lhe permite ir além.


Do ponto de vista programático, por mais que a realidade – em seu conjunto – imponha limites à consciência da numerosa vanguarda juvenil mundial, a decadência dos aparatos abre espaço para a construção de uma alternativa revolucionária perante essas lutas. A burguesia e o imperialismo vão tentar todo tipo de manobra para frear e desviá-las. Até agora, a mais eficaz tem sido incorporar, cooptar, absorver o novo que surge para dentro do regime democrático burguês. A velha estratégia reformista de radicalizar a democracia e humanizar o capitalismo ganha novas direções. Na Espanha, as direções que se identificam como defensoras das medidas anticrise da Islândia e da verdadeira democracia são parte disso.

No seu conteúdo, o conjunto dessas mobilizações se choca com capitalismo. A única solução estratégica para as tarefas colocadas é a ruptura com o sistema. Mas quem não sabe contra quem luta não pode vencer. Por isso, é preciso dar uma forte batalha política e ideológica para que esta geração abrace a luta pelo socialismo.


Notas:
1.Em 1992, pouco depois da queda da URSS, o cientista político norte-americano Francos Fukuyama escreveu o livro O Fim da História no qual expõe a tese de que o devir histórico havia terminado com o triunfo do capitalismo sobre o socialismo.
2. quinhentoseuristas: aqueles que ganham o salário mínimo português de 500 euros, totalmente insuficiente para o sustento de uma família.


Os jovens são o alvo preferencial da crise econômica
Estatuto da Juventude: Com a nova lei os jovens terão ainda menos direitos



Juventude do PSTU


• No dia 15 de fevereiro a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado aprovou o Estatuto da Juventude – PLC 98/2011. Era de se esperar que este fosse um motivo de comemoração, mas, infelizmente, não é. Ao invés de ampliar os direitos dos jovens brasileiros, o estatuto é um forte ataque aos poucos que já existem.

O projeto restringe a meia entrada em eventos culturais e esportivos a 40% das vagas em eventos privados e 50% nos públicos. É um ataque escandaloso, ainda mais em um país onde o preço dos ingressos dos cinemas, dos shows e dos jogos de futebol já afasta boa parte da juventude do direito ao lazer.

O passe livre nacional, uma reivindicação histórica do movimento estudantil brasileiro, passou longe dos debates do projeto. Apoiado por Demóstenes Torres (DEM –GO), o relator Randolfe Rodrigues (PSOL) retirou do texto o desconto de 50% nas passagens intermunicipais e interestaduais. No lugar ele incluiu duas vagas gratuitas por veículo para jovens com renda até dois salários mínimos. Alguém tem que avisar ao Senador que existem milhões de jovens nessa faixa salarial.

O projeto também chama atenção pelos seus apoiadores. Já era esperada a posição do Senador do DEM e de Aloísio Nunes – PSDB que batalharam durante toda a tramitação do projeto para defender os interesses da indústria do entretenimento e das empresas que controlam o transporte público. O surpreendente foi esse projeto contar com o aval de um senador do PSOL, um partido de esquerda que deveria estar do outro lado nesse debate.

Nas fotos da aprovação do projeto Randolfe aparece festejando junto com os dirigentes da UNE, que não só apóia como fez ativa campanha pela aprovação da proposta. Esse dia vai entrar para história do movimento estudantil brasileiro como mais um lamentável episódio em que a entidade vende (desta vez literalmente) os interesses dos estudantes.

Os apoiadores do projeto apontam que o fato do texto definir como jovem aquele que tem entre 15 e 29 anos é um grande avanço. Esqueceram de dizer que não basta ser jovem, nem basta ser estudante, para ter o direito (restrito) à meia entrada, o estudante agora tem que comprar a carteirinha da UNE. Há mais de uma década a entidade ganhou o apelido de “fábrica de carteirinhas”, porque abandou as lutas e transformou uma tradição de auto financiamento em uma vergonha para o movimento estudantil. Agora o Estatuto da Juventude vai conferir a entidade o selo oficial de “fábrica de carteirinhas” em troca do direito irrestrito ao lazer da juventude.